sábado, 13 de fevereiro de 2010

Egipto prepara-se para revelar segredos sobre Tutankhamon


O Egipto anunciou que, na próxima semana, vai fazer revelações importantes sobre a família e filiação de Tutankhamon, um dos grandes mistérios da antiguidade faraónica, com a ajuda de análises ao DNA.


O anúncio deverá ser feito no Museu de Arqueologia do Cairo, onde está exposto o tesouro descoberto em 1922 no túmulo do jovem faraó da XVIII dinastia, que morreu há mais de três mil anos.

O director do museu, Zahi Hawass, disse estar em condições de revelar “os segredos sobre a família e filiação de Tutankhamon, com base nos resultados das análises científicas à sua múmia”.

Hawass, que se opôs a que os testes ao DNA fossem realizados no estrangeiro, anunciou em Junho do ano passado que investigadores egípcios estavam a tentar solucionar o enigma da filiação do faraó.

A múmia do jovem príncipe proclamado rei com uma idade estimada de nove anos foi descoberta num sarcófago em ouro maciço pelo arqueólogo britânico Howard Carter, no Vale dos Reis, perto de Luxor.

O túmulo continha um tesouro excepcional, nomeadamente a máscara da múmia em ouro maciço que muito contribuiu para fazer de Tutankhamon um dos faraós mais conhecidos, mesmo que o seu reinado de uma dezena de anos tenha sido modesto.

A possibilidade de uma filiação com Nefertiti e a morte quando ainda era adolescente, fazem com que “a parte romântica desta história seja incontestada”, considera o egiptólogo francês Marc Gabolde, que se especializou na história do jovem rei.

Mas apesar das investigações intensas, a sua ascendência exacta ainda não foi precisada com exactidão, bem como as circunstâncias exactas da sua morte – doença, acidente ou assassinato – continuam a ser um enigma.

|Fonte: Público

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

'Stress' faz disparar problemas de sono nas crianças e jovens



Luís, João e Matilde são irmãos e todos têm dificuldade em dormir. Uma situação cada vez mais frequente entre as crianças e jovens, alertam os especialistas. Na origem da falta de sono está o stress do dia-a-dia da maioria das famílias, que os mais novos também sentem.

Um estudo realizado nos Estados Unidos revela que as crianças dormem hoje menos uma hora do que há 30 anos. E que a falta de sono se reflecte na redução dos níveis de inteligência, num comportamento ansioso e até contribui para o aumento da obesidade.

"Há 15 anos não tinha tantos casos de crianças com problemas de sono", reconhece ao DN o director do Serviço de Pediatria do Hospital de Santa Maria, em Lisboa, Gomes Pedro. "Actualmente, o stress nas famílias é maior", justifica o clínico. E a maior proximidade de pais e pediatras durante as consultas também ajuda a detectar mais cedo os problemas.

O tempo necessário para dormir varia de criança para criança, mas oito horas é o tempo de sono recomendável pelos médicos. 60% das crianças e jovens ouvidas pelos autores do estudo norte-americano confessaram sentirem-se sonolentos durante o dia, porque dormiam menos de sete horas por noite. O que tem consequências no seu aproveitamento escolar ou nos níveis de ansiedade durante o dia.

No caso de Luís, 20 anos, e João, de 17 anos, a falta de uma noite descansada não se repercutiu nas notas. Já Matilde, de cinco anos, deixou de ir ao infantário durante cerca de dois meses devido aos problemas de sono que a faziam acordar tarde e cansada.

"De um momento para o outro deixou de dormir. Só conseguia descansar um pouco se fosse para a minha cama e há muito que tinha perdido esse hábito", recordou ao DN a mãe, Maria José Salgueiro. Além da falta de sono, os pesadelos estragavam o pouco que conseguia dormir e, para agravar, começou a urinar com frequência.

As causas não são claras, mas quando em Novembro a família ficou doente, com suspeitas de gripe A, Matilde, sendo a mais nova, "recebeu muitos miminhos". No regresso à normalidade, a criança sentiu muito esta separação. "Começou a não querer ir para o infantário, achava que eu não gostava tanto dela, que não a queria comigo", contou a mãe. O stress de se separar da mãe terá estado na origem da falta de sono. A criança passou também a estar muito ansiosa durante o dia.

Já no caso de Luís foi a preocupação com o irmão que lhe roubou o descanso. Como filho mais velho sempre levou muito a sério o seu papel de proteger o irmão João, que é surdo profundo. "Preocupava-se com tudo. Qualquer problema faz com que durma mal. Sempre foi assim", afirmou a mãe.

João é uma situação "mais normal" entre os jovens que dormem mal. Gosta de estar bem preparado na escola e perde o sono principalmente nas alturas dos testes. Mas, tal como Luís, nunca recorreu a um médico. Afinal bastava um pouco de calma para controlar a ansiedade e conseguir dormir.

Com Matilde, Maria José Salgueiro optou por ir ao pediatra e o segredo para que a filha voltasse a dormir descansada na cama exigiu muita calma e paciência. Tanto Gomes Pedro como o psicólogo Bruno Pereira Gomes recomendam que o primeiro passo seja recorrer ao pediatra.

"Só em situações extremas é que há mesmo a necessidade de recorrer a um psicólogo. A solução para que uma criança normalize o seu sono passa pela existência de rituais, como uma hora concreta de ir para a cama", referiu ao DN Bruno Pereira Gomes.

Gomes Pedro salienta que as crianças absorvem todos os problemas familiares. E que para resolver a situação "há que reorganizar a desorganização". Por isso, é importante que os pediatras sugiram aos pais estratégias para garantir que os filhos tenham uma noite descansada (ver caixa), o que pode passar por uma simples mudança de hábitos.

A opinião é partilhada por Bruno Pereira Gomes. "Muitos pais têm problemas em se impor e as crianças vão testando os limites." Depois, há um ponto essencial: "Hoje em dia as crianças têm uma vida muito sedentária. As crianças precisam de tempo para extravasar a energia", conclui.

Fonte: Elisabete Silva, DN

Foi reconstituído 80% do ADN dum homem que viveu há 4000 anos.







Foi graças a um tufo de cabelo, conservado durante milénios no permafrost do Árctico, que uma equipa internacional de investigadores conseguiu, pela primeira vez, reconstituir 80 por cento do genoma de um ser humano pré-histórico e determinar alguns dos seus traços físicos, bem como alguns elementos da origem geográfica dos seus antepassados.



Eske Willerslev, da Universidade de Copenhaga, e os seus colegas, que publicam os seus resultados na revista Nature, baptizaram com o nome Inuk este velho humano – que os seus genes dizem ser do sexo masculino. Inuk, que viveu há uns quatro mil anos na Gronelândia, pertencia à cultura saqqaq, hoje extinta, conhecida como sendo a primeira a ter habitado aquela região do mundo. Trata-se de um povo sobre o qual pouco se sabe, porque pouco resta da sua cultura.

Os restos de cabelo – e também de osso – provêm da localidade de Qeqertasussuk. Mas, ironicamente, como conta também na Nature Rex Dalton, num perfil de Willerslev, não foi ele que os encontrou. O cientista já tinha procurado, em 2006, cabelos humanos no permafrost da tundra do norte da Gronelândia. Mas em vão. Qual não terá sido o seu espanto quando, dois anos mais tarde, deu com o cabelo de Inuk... numa cave do Museu de História Natural da Dinamarca, a escassos quarteirões de distância do seu próprio laboratório. Estava lá guardado há 20 anos.

Genómica último modelo

Utilizando a mais avançada geração de máquinas de sequenciação genética, os investigadores conseguiram, no ano passado, extrair e sequenciar o ADN do cabelo de Inuk. A operação demorou dois meses e meio e custou meio milhão de dólares. Graças a isso, puderam repetir a sequenciação 20 vezes, o que lhes permitiu obter resultados de grande precisão, com muito poucos erros de leitura dos seis mil milhões de bases do ADN (metade vinda da mãe de Inuk, metade do seu pai). “A nossa sequência”, disse Willerslev durante uma conferência telefónica com jornalistas, “é comparável em qualidade à dos genomas sequenciados até agora de indivíduos actuais”.

A seguir, os cientistas fizeram, basicamente, o que faz hoje qualquer uma daquelas empresas que, por algumas centenas de euros, nos propõem analisar o nosso genoma para determinar a nossa ancestralidade, características físicas e os nossos riscos perante diversas doenças: estudaram os chamados SNP de Inuk – mais precisamente, 350 mil destes marcadores genéticos. Os SNP, ou single nucleotide polymorphisms, são variações pontuais, numa única letra do ADN, distribuídas por todo genoma e que permitem deduzir este tipo de informações comparando os indivíduos.

Concluíram assim, entre outras coisas, que Inuk tinha provavelmente os olhos e a pele castanha, que tinha os dentes “em forma de pá” (uma morfologia característica dos povos asiáticos) e que estava geneticamente adaptado ao clima frio do seu habitat. Que a cera dos seus ouvidos era seca, que o seu grupo sanguíneo era A+ e que tinha uma tendência para a calvície. A este propósito, Willerslev salienta que “este tipo tinha ainda muito cabelo, portanto deve ter morrido jovem...”

Mas a grande surpresa veio do estudo da ancestralidade de Inuk. “Descobrimos que as populações actuais geneticamente mais próximas de Inuk”, acrescenta Willerslev, “são três populações da Sibéria”. Os nganasans, os koryaks e os chukchis. Embora Inuk possa não ser representativo da cultura saqqaq, isto sugere que, ao contrário do que se pensava, terá havido, há uns 5500 anos, uma migração do Velho Mundo para o Novo Mundo até agora desconhecida e independente da dos antepassados dos inuit e dos índios da América do Norte. Inuk tem, ao que tudo indica, antepassados diferentes destas duas outras populações. Trata-se de uma migração “substancial e relativamente recente que atravessou o estreito de Bering da América do Norte até a Gronelândia”, escrevem por seu lado dois especialistas, David Lambert e Leon Huynen, da Universidade Griffith, na Austrália, num comentário que acompanha a publicação dos resultados.

Naquela altura, frisa ainda Willerslev, “terão tido de atravessar o mar de Bering de barco ou de passar por cima do gelo aproveitando o Inverno”.

Desta vez, os investigadores utilizaram o melhor material imaginável para extrair o ADN: um espécimen congelado – e portanto pouco degradado ou contaminado com ADN de outras espécies. Mas os cientistas confiam que, mesmo com outro tipo de restos, vindos de latitudes mais amenas, será possível fazer o mesmo. Morten Rasmussen, um dos co-autores do trabalho, explicou aos jornalistas que para isso, bastará que os fragmentos de ADN sequenciados “sejam suficientemente compridos para encaixar sem ambiguidade numa dada localização do genoma humano”.

“Vamos ver aparecer muitos mais resultados destes nos próximos cinco anos”, garante Willerslev. O seu próximo objectivo: fazer o mesmo com múmias. “Há, um pouco por toda a América do Sul, múmias que têm entre 8000 anos e uns séculos.”

Fonte: Ana Gerschenfeld, Público

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Decifrado genoma de pessoa morta há quatro mil anos




Trabalho na 'Nature' é o primeiro que desvenda a quase totalidade do ADN de alguém falecido há muito

Chamaram-lhe Inuk, que significa ser humano na actual língua da Gronelândia. Inuk, que era moreno, tinha olhos castanhos e tendência para a calvície, foi um dos primeiros povoadores daquela região, há mais de quatro mil anos, mas agora regressou dos mortos para contar uma história de pioneirismo e de migrações milenares, graças à genética. Bastou um tufo de cabelos que estava num museu. A partir dele foi possível reconstituir pela primeira vez o genoma quase completo de uma pessoa morta há muito. Esta é também a história de um feito pioneiro da ciência.

O trabalho, publicado hoje na revista Nature, foi realizado por um grupo de investigadores coordenado pelo especialista em genética Eske Willerslev, da Universidade de Copenhaga, na Dinamarca, e permitiu sequenciar pela primeira vez 80% do genoma nuclear (a informação genética contida no núcleo da célula) de um ser humano morto há muito. "Até agora, nenhum genoma de um ser humano do passado tinha sido publicado", diz a equipa no seu artigo, referindo que os únicos elementos disponíveis deste tipo eram "alguns milhares de pares de bases do ADN de um neandertal", ou seja, uma porção ínfima da sua informação genética.

No caso de Inuk, os investigadores conseguiram decifrar o astronómico número de três mil milhões de pares de bases (blocos químicos mais elementares) do seu ADN. Para esse êxito, explicaram os investigadores, contou também "o estado de excelente conservação do ADN" devido ao permafrost (solo gelado) no qual se manteve preservado.

Esta não é a primeira vez que o investigador Eske Willerslev se distingue nesta área. Há apenas um ano, foi também ele que coordenou a equipa que reconstruiu o genoma mitocondrial (presente numa estrutura celular chamada mitocondrial) completo de um mamute.

Quanto a Inuk, a sua informação genética mostra que ele tinha o grupo sanguíneo A positivo e que pertenceu ao primeiro povo povoador da Gronelândia, os saqqaq, que migraram para aquelas paragens há cerca de seis mil anos, vindos da Sibéria. Ainda é com os actuais povos siberianos que Inuk mais se parece, e não com os actuais esquimós.
Fonte: Filomena Naves, DN

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

A mesma hormona está presente no amor e no ciúme




A oxitocina, que se sabe ser crucial nas emoções positivas, tem uma função no seu oposto.

A hormona oxitocina, importante no parto humano e também conhecida como "hormona do amor", tem afinal um papel em emoções consideradas negativas, como ciúme ou inveja. Esta descoberta foi feita por cientistas da Universidade de Haifa, em Israel.

Estudos anteriores tinham identificado a presença da oxitocina em emoções positivas, como a empatia ou a confiança. A hormona é libertada durante relações sexuais ou parto, quando as pessoas se abraçam, e sabe-se que tem a maior importância no estabelecimento de relações sociais.

O novo estudo, publicado na revista Biological Psychiatry, baseou-se numa experiência em que os participantes receberam formas sintéticas de oxitocina e placebos. Os voluntários foram colocados numa situação de jogo que propiciava competição e inveja. Estes sentimentos negativos eram mais elevados na presença da hormona.

Os cientistas explicam o resultado como confirmando o papel social da oxitocina. Mas a sua função dependerá da associação: se for positiva, o sentimento desencadeado será positivo; se a associação for negativa, o sentimento provocado também será negativo. Mais uma vez se confirmam os poetas, segundo os quais o amor também pode ser facilmente o seu contrário.

Fonte: DN

Descobertas bases genéticas do envelhecimento


Pela primeira vez, foram identificadas variantes genéticas claramente ligadas ao envelhecimento biológico nos seres humanos. O resultado poderá permitir perceber por que é que não somos todos iguais perante a velhice.

Todos temos duas idades – a cronológica (os nossos anos) e a biológica (a idade das nossas células) –, que nem sempre são equivalentes. É por isso que certas pessoas idosas conservam a juventude arterial e mental e outras, mais novas, desenvolvem doenças coronárias ou demências senis. Uma medida dessa idade biológica são os telómeros, umas pequenas sequências genéticas repetitivas situadas nas extremidades dos cromossomas. Os telómeros vão-se encurtando, mais ou menos depressa, à medida que as células se dividem e envelhecem.

Nilesh Samani, da Universidade de Leicester, e colegas – cujos resultados acabam de ser publicados na revista Nature Genetics – descobriram agora, pela primeira vez, que os telómeros das pessoas portadoras de certas variantes genéticas pontuais (de certos “marcadores”, os single nucleotide polymorphisms ou SNP) eram mais curtos do que os das não portadoras – fazendo com que as portadoras fossem biologicamente mais velhas do que as outras apesar de terem a mesma idade em anos. As variantes (são duas) estão situadas no cromossoma humano 3, uma de cada lado de um gene chamado TERC, conhecido pelo seu papel na manutenção do comprimento dos telómeros – o que sugere que possam estar a assinalar que o gene TERC funciona, nos portadores, de forma menos eficiente.

“O que o nosso estudo sugere é que certas pessoas estão geneticamente programadas para envelhecer mais depressa”, diz o co-autor Tim Spector, do King’s College de Londres, num comunicado. “O efeito foi considerável, equivalente a [vários] anos adicionais de idade biológica (...). E as pessoas portadoras destas variantes poderão envelhecer mais depressa ainda se forem expostas a ambientes ‘maus’ para os telómeros: tabagismo, obesidade ou falta de exercício – acabando por desenvolver um maior número de doenças ligadas ao envelhecimento.”

O estudo exigiu a leitura de uns 500 mil SNP espalhados pelos genomas de mais de 3000 pessoas. No caso de uma das duas variantes identificadas, 55 por cento da população estudada não apresentava essa variante, 38 por cento era portadora de uma cópia e sete por cento de duas (uma vinda do pai e uma da mãe). Em relação aos não portadores da mesma idade cronológica, uma cópia da variante correspondia em média a mais três a quatro anos de idade biológica e duas cópias a mais uns oito anos.

Fonte: Ana Gerschenfeld, Público

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Breves pausas podem ajudar na manutenção da memória


Os cientistas sempre souberam que dormir ajuda na consolidação da memória, permitindo que a mente possa filtrar e registar no cérebro o conhecimento adquirido. Entretanto, uma nova pesquisa sugeriu que breve descansos ou pausas podem auxiliar na retenção de informação.

O estudo foi realizado por cientistas da Universidade de Nova York e foi publicado na revista especializada Neuron.

Os resultados da pesquisa podem explicar o motivo pelo qual lembramos de factos ou conhecimentos específicos com detalhes, enquanto esquecemos de algumas outras informações quase que imediatamente.

"Fazer um intervalo entre uma aula e outra, por exemplo, pode realmente ajudar as pessoas a guardarem as informações que acabarem de receber", disse a médica Lila Davachi, professora-assistente do Departamento de Psicologia e Neurociência da Universidade de Nova York.

Para determinar se a consolidação da memória ocorreu durante períodos em que os pacientes estavam acordados, os pesquisadores analisaram imagens de áreas do cérebro conhecidas por desempenhar um papel significativo na memória, o hipocampo e as regiões corticais.

Intitulado "Seu cérebro precisa que você sintonize outras tarefas para que ele possa entrar em sintonia com o que você acabou de aprender", a experiência foi baseada num teste onde imagens de rostos e objectos eram exibidas às pessoas. A cada novo "pacote de informações", os pacientes eram submetidos a períodos de descanso regulares.

Os cientistas usaram ressonância magnética para medir as actividades cerebrais durante os testes e ao longo do período de descanso.

Segundo os especialistas, as áreas do cérebro continuaram activas durante as pausas, assim como ocorreu durante a aprendizagem de uma nova tarefa. Os cientistas ainda relacionaram a pausa ao facto de se aprender melhor uma actividade e se lembrar dela em futuros testes.

"O seu cérebro está a trabalhar por você enquanto está descansando, então a pausa é importante para a memória e para as funções cognitivas", explicou a doutora Davachi.

Os pesquisadores descobriram que a mente regista memórias ao longo do dia e à noite faz uma espécie de "edição" do que realmente será armazenado pelo o cérebro.

Fonte: Revista Veja

"Um suicídio no trabalho é uma mensagem brutal"

Nos últimos anos, três ferramentas de gestão estiveram na base de uma transformação radical da maneira como trabalhamos: a avaliação individual do desempenho, a exigência de “qualidade total” e o outsourcing. O fenómeno gerou doenças mentais ligadas ao trabalho. Christophe Dejours, especialista na matéria, desmonta a espiral de solidão e de desespero que pode levar ao suicídio.

Psiquiatra, psicanalista e professor no Conservatoire National des Arts et Métiers, em Paris, Christophe Dejours dirige ali o Laboratório de Psicologia do Trabalho e da Acção – uma das raras equipas no mundo que estuda a relação entre trabalho e doença mental. Esteve há dias em Lisboa, onde, de gravata amarela, cabeleira “à Beethoven” e olhos risonhos a espreitar por detrás de pequenos óculos de massa redondos, falou do sofrimento no trabalho. Não apenas do sofrimento enquanto gerador de patologias mentais ou de esgotamentos, mas sobretudo enquanto base para a realização pessoal. Não há “trabalho vivo” sem sofrimento, sem afecto, sem envolvimento pessoal, explicou. É o sofrimento que mobiliza a inteligência e guia a intuição no trabalho, que permite chegar à solução que se procura.

Claro que no outro extremo da escala, nas condições de injustiça ou de assédio que hoje em dia se vivem por vezes nas empresas, há um tipo de sofrimento no trabalho que conduz ao isolamento, ao desespero, à depressão. No seu último livro, publicado há uns meses em França e intitulado Suicide et Travail: Que Faire? , Dejours aborda especificamente a questão do suicídio no trabalho, que se tornou muito mediática com a vaga de suicídios que se verificou recentemente na France Télécom.

Depois da conferência, o médico e cientista falou com o P2 sobre as causas laborais desses gestos extremos, trágicos e irreversíveis. Mais geralmente, explicou-nos como a destruição pelos gestores dos elos sociais no trabalho nos fragiliza a todos perante a doença mental.

O suicídio ligado ao trabalho é um fenómeno novo?
O que é muito novo é a emergência de suicídios e de tentativas de suicídio no próprio local de trabalho. Apareceu em França há apenas 12, 13 anos. E não só em França – as primeiras investigações foram feitas na Bélgica, nas linhas de montagem de automóveis alemães. É um fenómeno que atinge todos os países ocidentais. O facto de as pessoas irem suicidar-se no local de trabalho tem obviamente um significado. É uma mensagem extremamente brutal, a pior do que se possa imaginar – mas não é uma chantagem, porque essas pessoas não ganham nada com o seu suicídio. É dirigida à comunidade de trabalho, aos colegas, ao chefe, aos subalternos, à empresa. Toda a questão reside em descodificar essa mensagem.

Afecta certas categorias de trabalhadores mais do que outras?
Na minha experiência, há suicídios em todas as categorias – nas linhas de montagem, entre os quadros superiores das telecomunicações, entre os bancários, nos trabalhadores dos serviços, nas actividades industriais, na agricultura.

No passado, não havia suicídios ligados ao trabalho na indústria. Eram os agricultores que se suicidavam por causa do trabalho – os assalariados agrícolas e os pequenos proprietários cuja actividade tinha sido destruída pela concorrência das grandes explorações. Ainda há suicídios no mundo agrícola.

O que é que mudou nas empresas?
A organização do trabalho. Para nós, clínicos, o que mudou foram principalmente três coisas: a introdução de novos métodos de avaliação do trabalho, em particular a avaliação individual do desempenho; a introdução de técnicas ligadas à chamada “qualidade total”; e o outsourcing, que tornou o trabalho mais precário.

A avaliação individual é uma técnica extremamente poderosa que modificou totalmente o mundo do trabalho, porque pôs em concorrência os serviços, as empresas, as sucursais – e também os indivíduos. E se estiver associada quer a prémios ou promoções, quer a ameaças em relação à manutenção do emprego, isso gera o medo. E como as pessoas estão agora a competir entre elas, o êxito dos colegas constitui uma ameaça, altera profundamente as relações no trabalho: “O que quero é que os outros não consigam fazer bem o seu trabalho.”

Muito rapidamente, as pessoas aprendem a sonegar informação, a fazer circular boatos e, aos poucos, todos os elos que existiam até aí – a atenção aos outros, a consideração, a ajuda mútua – acabam por ser destruídos. As pessoas já não se falam, já não olham umas para as outras. E quando uma delas é vítima de uma injustiça, quando é escolhida como alvo de um assédio, ninguém se mexe…

Mas o assédio no trabalho é novo?
Não, mas a diferença é que, antes, as pessoas não adoeciam. O que mudou não foi o assédio, o que mudou é que as solidariedades desapareceram. Quando alguém era assediado, beneficiava do olhar dos outros, da ajuda dos outros, ou simplesmente do testemunho dos outros. Agora estão sós perante o assediador – é isso que é particularmente difícil de suportar. O mais difícil em tudo isto não é o facto de ser assediado, mas o facto de viver uma traição – a traição dos outros. Descobrimos de repente que as pessoas com quem trabalhamos há anos são cobardes, que se recusam a testemunhar, que nos evitam, que não querem falar connosco. Aí é que se torna difícil sair do poço, sobretudo para os que gostam do seu trabalho, para os mais envolvidos profissionalmente. Muitas vezes, a empresa pediu-lhes sacrifícios importantes, em termos de sobrecarga de trabalho, de ritmo de trabalho, de objectivos a atingir. E até lhes pode ter pedido (o que é algo de relativamente novo) para fazerem coisas que vão contra a sua ética de trabalho, que moralmente desaprovam.

Qual é o perfil das pessoas que são alvo de assédio?
São justamente pessoas que acreditam no seu trabalho, que estão envolvidas e que, quando começam a ser censuradas de forma injusta, são muito vulneráveis. Por outro lado, são frequentemente pessoas muito honestas e algo ingénuas. Portanto, quando lhes pedem coisas que vão contra as regras da profissão, contra a lei e os regulamentos, contra o código do trabalho, recusam-se a fazê-las. Por exemplo, recusam-se a assinar um balanço contabilista manipulado. E em vez de ficarem caladas, dizem-no bem alto. Os colegas não dizem nada, já perceberam há muito tempo como as coisas funcionam na empresa, já há muito que desviaram o olhar. Toda a gente é cúmplice. Mas o tipo empenhado, honesto e algo ingénuo continua a falar. Não devia ter insistido. E como falou à frente de todos, torna-se um alvo. O chefe vai mostrar a todos quão impensável é dizer abertamente coisas que não devem aparecer nos relatórios de actividade.

Um único caso de assédio tem um efeito extremamente potente sobre toda a comunidade de uma empresa. Uma mulher está a ser assediada e vai ser destruída, uma situação de uma total injustiça; ninguém se mexe, mas todos ficam ainda com mais medo do que antes. O medo instala-se. Com um único assédio, consegue-se dominar o colectivo de trabalho todo. Por isso, é importante, ao contrário do que se diz, que o assédio seja bem visível para todos. Há técnicas que são ensinadas, que fazem parte da formação em matéria de assédio, com psicólogos a fazer essa formação.

Uma formação para o assédio?
Exactamente. Há estágios para aprenderem essas técnicas. Posso contar, por exemplo, o caso de um estágio de formação em França em que, no início, cada um dos 15 participantes, todos eles quadros superiores, recebeu um gatinho. O estágio durou uma semana e, durante essa semana, cada participante tinha de tomar conta do seu gatinho. Como é óbvio, as pessoas afeiçoaram-se ao seu gato, cada um falava do seu gato durante as reuniões, etc.. E, no fim do estágio, o director do estágio deu a todos a ordem de… matar o seu gato.

Está a descrever um cenário totalmente nazi...
Só que aqui ninguém estava a apontar uma espingarda à cabeça de ninguém para o obrigar a matar o gato. Seja como for, um dos participantes, uma mulher, adoeceu. Teve uma descompensação aguda e eu tive de tratá-la – foi assim que soube do caso. Mas os outros 14 mataram os seus gatos. O estágio era para aprender a ser impiedoso, uma aprendizagem do assédio.

Penso que há bastantes empresas que recorrem a este tipo de formação – muitas empresas cujos quadros, responsáveis de recursos humanos, etc., são ensinados a comportar-se dessa maneira.

Voltando ao perfil do assediado, é perigoso acreditar realmente no seu trabalho?
É. O que vemos é que, hoje em dia, envolver-se demasiado no seu trabalho representa um verdadeiro perigo. Mas, ao mesmo tempo, não pode haver inteligência no trabalho sem envolvimento pessoal – sem um envolvimento total.

Isso gera, aliás, um dilema terrível, nomeadamente em relação aos nossos filhos. As pessoas suicidam-se no trabalho, portanto não podemos dizer aos nossos filhos, como os nossos pais nos disseram a nós, que é graças ao trabalho que nos podemos emancipar e realizar-nos pessoalmente. Hoje, vemo-nos obrigados a dizer aos nossos filhos que é preciso trabalhar, mas não muito. É uma mensagem totalmente contraditória.

E os sindicatos?
Penso que os sindicatos foram em parte destruídos pela evolução da organização do trabalho. Não se opuseram à introdução dos novos métodos de avaliação. Mesmo os trabalhadores sindicalizados viram-se presos numa dinâmica em que aceitaram compromissos com a direcção. Em França, a sindicalização diminuiu imenso – as pessoas já não acreditam nos sindicatos porque conhecem as suas práticas desleais.

Como distinguir um suicídio ligado ao trabalho de um suicídio devido a outras causas?
É uma pergunta à qual nem sempre é possível responder. Hoje em dia, não somos capazes de esclarecer todos os suicídios no trabalho. Mas há casos em que é indiscutível que o que está em causa é o trabalho. Quando as pessoas se matam no local de trabalho, não há dúvida de que o trabalho está em causa. Quando o suicídio acontece fora do local de trabalho e a pessoa deixa cartas, um diário, onde explica por que se suicida, também não há dúvidas – são documentos aterradores. Mas quando as pessoas se suicidam fora do local do trabalho e não deixam uma nota, é muito complicado fazer a distinção. Porém, às vezes é possível. Um caso recente – e uma das minhas vitórias pessoais – foi julgado antes do Natal, em Paris. Foi um processo bastante longo contra a Renault por causa do suicídio de vários engenheiros e cientistas altamente qualificados que trabalhavam na concepção dos veículos, num centro de pesquisas da empresa em Guyancourt, perto de Paris.

Quando é que isso aconteceu?
Em 2006-2007. Houve cinco suicídios consecutivos; quatro atiraram-se do topo de umas escadas interiores, do quinto andar, à frente dos colegas, num local com muita passagem à hora do almoço. Mas um deles – aliás de origem portuguesa – não se suicidou no local do trabalho. Era muitíssimo utilizado pela Renault nas discussões e negociações sobre novos modelos e produção de peças no Brasil. Foi utilizado, explorado de forma aterradora. Pediam-lhe constantemente para ir ao Brasil e o homem estava exausto por causa da diferença horária. Era uma pessoa totalmente dedicada, tinha mesmo feito coisas sem ninguém lhe pedir, como traduzir documentos técnicos para português, para tentar ganhar o mercado brasileiro para a empresa. A dada altura, teve uma depressão bastante grave e acabou por se suicidar.

A viúva processou a Renault, que em Dezembro acabou por ser condenada por “falta imperdoável do empregador” [conceito do direito da segurança social em França], por não ter tomado as devidas precauções.

Foi um acontecimento importante porque, pela primeira vez, uma grande multinacional foi condenada em virtude das suas práticas inadmissíveis. Os advogados do trabalho apoiaram-se muito nos resultados científicos do meu laboratório. O acórdão do tribunal tinha 25 páginas e as provas foram consideradas esmagadoras. Havia e-mails onde o engenheiro dizia que já não aguentava mais – e que a empresa fez desaparecer limpando o disco rígido do seu computador. Mas ele tinha cópias dos documentos no seu computador de casa. A argumentação foi imparável.

Mesmo assim, as empresas continuam a dizer que os suicídios dos seus funcionários têm a ver com a vida privada e não com o trabalho.
Toda a gente tem problemas pessoais. Portanto, quando alguém diz que uma pessoa se suicidou por razões pessoais, não está totalmente errado. Se procurarmos bem, vamos acabar por encontrar, na maioria dos casos, sinais precursores, sinais de fragilidade. Há quem já tenha estado doente, há quem tenha tido episódios depressivos no passado. É preciso fazer uma investigação muito aprofundada.

Mas se a empresa pretender provar que a crise depressiva de uma pessoa se deve a problemas pessoais, vai ter de explicar por que é que, durante 10, 15, 20 anos, essa pessoa, apesar das suas fragilidades, funcionou bem no trabalho e não adoeceu.

Mas como é que o trabalho pode conduzir ao suicídio? Só acontece a pessoas com determinada vulnerabilidade?
Só muito recentemente é que percebi que uma pessoa podia ser levada ao suicídio sem que tivesse até ali apresentado qualquer sinal de vulnerabilidade psicopatológica. Fiquei extremamente surpreendido com um caso em especial, do qual não posso falar muito aqui, porque ainda não foi julgado, de uma mulher que se suicidou na sequência de um assédio no trabalho.

A Polícia Judiciária [francesa] tinha interrogado os seus colegas de trabalho e, como a ordem vinha de um juiz, as pessoas falaram. Foram 40 depoimentos que descreviam a maneira como essa mulher tinha sido tratada pelo patrão (apenas uma contradiz as restantes 39). E o que emerge é que, devido ao assédio, ela caiu num estado psicopatológico muito parecido com um acesso de melancolia.

Ora, o que mais me espantou, quando procurei sinais precursores, é que não encontrei absolutamente nada. E, pela primeira vez, comecei a pensar que, em certas situações, quando uma pessoa que não é melancólica é escolhida como alvo de assédio, é possível fabricar, desencadear, uma verdadeira depressão em tudo igual à melancolia. Quando essa pessoa se vai abaixo, tem uma depressão, autodesvaloriza-se, torna-se pessimista, pensa que não vale nada, que merece realmente morrer.

Era uma mulher hiperbrilhante, muitíssimo apreciada, muito envolvida, imaginativa, produtiva. Tinha duas crianças óptimas e um marido excepcional. Falei com os seus amigos, o marido, a mãe. Não encontrei nenhum sinal precursor, nem sequer na sua infância.

Aconteceu sem pré-aviso?
Houve um período crítico que terá durado um mês. As pessoas à sua volta deram por isso. Viram que ela estava muito mal, o médico do trabalho foi avisado e obrigou-a a parar de trabalhar e pediu a alguém que a levasse para casa. Mas ela não queria parar, insistia que queria fazer o que tinha a fazer. A família também percebeu que algo estava a acontecer, ela consultou um psiquiatra, mas é impossível travar este tipo de descompensação. Foi para casa da mãe, mas quando pensaram que estava a melhorar um pouco, relaxaram a vigilância e ela atirou-se pela janela.

Nos testemunhos recolhidos pela polícia, vê-se claramente que ninguém se atreveu a ajudá-la; todos dizem que tinham medo. Tinham medo do patrão, que era um tirano. Também assediava sexualmente as mulheres e esta mulher era muito bonita. Não consegui saber se tinha havido assédio sexual, mas várias pessoas evocam no seu depoimento que ela terá caído em desgraça porque se tinha recusado a fazer o que ele queria.

O caso da France Télécom foi muito mediático, com 25 suicídios. O suicídio é mais frequente nas grandes empresas?
Não. Nas grandes empresas pode ser mais visível, mas há também muitas pequenas empresas onde as coisas correm muito mal, onde os critérios são incrivelmente arbitrários e onde o assédio pode ser pior. Nas grandes empresas, subsiste por vezes uma presença sindical que faz com que os casos venham a público. Foi assim na France Télécom. Mas não acredito que a destruição actual do mundo do trabalho esteja a acontecer apenas nalgumas grandes multinacionais. E é importante salientar que também há multinacionais onde as coisas correm bem.

Quantas pessoas se suicidam por ano, em França e noutros países?
Não há estatísticas do suicídio no trabalho. Em França, foi constituída uma comissão ministerial onde pela primeira vez foi dito claramente que é urgente aplicar ferramentas que permitam analisar a relação entre suicídio e trabalho. Mas, por enquanto, isso não existe. Nem na Bélgica, nem no Canadá, nem nos Estados Unidos, não existe em sítio nenhum.

Na Suécia, por exemplo, há provavelmente tantos suicídios no trabalho como em França. Mas não há debate. Em muitos países não há debate, porque não existe esse espaço clínico, essa nova medicina do trabalho que estamos a desenvolver em França. De facto, a França é dos sítios onde mais se fala do assunto. O debate francês interessa muita gente, mas também mete muito medo.

Em França, foi feito um único inquérito, há quatro anos, pela Inspecção Médica do Trabalho, em três departamentos [divisões administrativas], passando pelos médicos do trabalho, e chegaram a um total de 50 suicídios em cinco anos. É provavelmente um valor subestimado, mas, extrapolando-o a todos os departamentos, dá entre 300 e 400 suicídios no trabalho por ano.

Falou de “qualidade total”. O que é exactamente?
É uma segunda medida que foi introduzida na sequência da avaliação individual. Acontece que, quando se faz a avaliação individual do desempenho, está-se a querer avaliar algo, o trabalho, que não é possível avaliar de forma quantitativa, objectiva, através de medições. Portanto, o que está a ser medido na avaliação não é o trabalho. No melhor dos casos, está-se a medir o resultado do trabalho. Mas isso não é a mesma coisa. Não existe uma relação de proporcionalidade entre o trabalho e o resultado do trabalho.

É como se em vez de olhar para o conteúdo dos artigos de um jornalista, apenas se contasse o número de artigos que esse jornalista escreveu. Há quem escreva artigos todos os dias, mas enfim... é para contar que houve um acidente de viação ou outra coisa qualquer. Uma única entrevista, como esta por exemplo, demora muito mais tempo a escrever e, para fazer as coisas seriamente, vai implicar que o jornalista escreva entretanto menos artigos. Hoje em dia, julga-se os cientistas pelo número de artigos que publicam. Mas isso não reflecte o trabalho do cientista, que talvez esteja a fazer um trabalho difícil e não tenha publicado durante vários anos porque não conseguiu obter resultados.

Passados uns tempos, surgem queixas a dizer que a qualidade [da produção ou do serviço] está a degradar-se. Então, para além das avaliações, os gestores começam a controlar a qualidade e declaram como objectivo a “qualidade total”. Não conhecem os ofícios, mas vão definir pontos de controlo da qualidade. É verdadeiramente alucinante.

Para além de que declarar a qualidade total é catastrófico, justamente porque a qualidade total é um ideal. É importante ter o ideal da qualidade total, ter o ideal do “zero-defeitos”, do “zero-acidentes”, mas apenas como ideal.

Em diabetologia, por exemplo, os gestores introduziram a obrigação de os médicos fazerem, para cada um dos seus doentes, ao longo de três meses, a média dos níveis de hemoglobina glicosilada A1c [ri-se], que é um indicador da concentração de açúcar no sangue. A seguir, comparam entre si os grupos de doentes de cada médico – é assim que controlam a qualidade dos cuidados médicos. [ri-se].

Só que, na realidade, quando tratamos um doente, às vezes o tratamento não funciona e temos de perceber porquê. E finalmente, o doente acaba por nos confessar que não consegue respeitar o regime alimentar que lhe prescrevemos, porque inclui legumes e não féculas e que os legumes são mais caros... Tem três filhos e não tem dinheiro para legumes. E então, vamos ter de encontrar um compromisso.

Da mesma forma, se um doente diabético é engenheiro e tem de viajar frequentemente para outros fusos horários, torna-se muito difícil controlar a sua glicemia com insulina. Mais uma vez, vai ser preciso encontrar um meio-termo. E isso é difícil.

Mesmo uma central nuclear nunca funciona como previsto. Nunca. Por isso é que precisamos de “trabalho vivo”. A qualidade total é um contra-senso porque a realidade se encarrega de fazer com que as coisas não funcionem de forma ideal. Mas o gestor não quer ouvir falar disso.

Ora, quando o ideal se transforma na condição para obter uma certificação, o que acontece é que se está a obrigar toda a gente a dissimular o que realmente se passa no trabalho. Deixa de ser possível falar do que não funciona, das dificuldades encontradas. Quando há um incidente numa central nuclear, o melhor é não dizer nada.

Isso é extremamente grave.
É. E em medicina passa-se a mesma coisa. Faz-se batota. Hoje, existem nos hospitais as chamadas “conferências de consenso” – acho que existem em toda a Europa – onde são feitas recomendações precisas para o tratamento de tal ou tal doença. E quando um médico recebe um doente, tem de teclar no computador para ver o que foi estabelecido pela conferência de consenso. O médico, que tem o doente à sua frente, pensa que essa não é a boa abordagem – porque sabe que o doente tem problemas com a mulher, com os filhos e não vai conseguir fazer o tratamento recomendado. Mas sabe também que se não fizer o que está lá escrito, e se por acaso as coisas derem para o torto, poderá haver um inquérito, a pedido da família ou de um gestor, e vão dizer que foi o médico que não fez o que devia. O problema da qualidade total é que obriga muitos de nós a viver essa experiência atroz que consiste em fazer o nosso trabalho de uma forma que nos envergonha.

Há muitos suicídios entre os médicos?
Cada vez mais. Há especialidades com mais suicídios do que outras – nomeadamente entre os médicos reanimadores. Em França é uma verdadeira hecatombe: é sabido que a profissão de anestesista-reanimador é das que têm maior taxa de suicídios. Nesta especialidade, os riscos de ser-se atacado em tribunal porque alguém morreu são tão elevados que os médicos se protegem seguindo as instruções. Mesmo que tenham a íntima convicção de que não era isso que deveriam fazer. Chegámos a esse ponto.

É uma situação insuportável e há médicos que não aguentam ver um doente morrer porque tiveram medo de que isso se virasse contra eles. “Fiz o que estava escrito e o doente morreu. Matei o doente.” Há cada vez mais reanimadores que se confrontam com esta situação. Ainda por cima os cirurgiões atiram sempre as dificuldades que encontram nas operações para cima do reanimador. Sempre. Cada vez que acontece qualquer coisa, é porque o anestesista não adormeceu bem o doente, ou não o acordou correctamente, ou não soube restabelecer a pressão arterial. O cirurgião nunca admitirá que falhou nas suturas e que por isso o doente se esvaiu em sangue.

Os médicos sempre foram considerados uma classe muito solidária…
Foram. Já não são. Eu trabalhei anos nos hospitais, e adorava trabalhar lá, porque existia um espírito de equipa fantástico. Éramos felizes no nosso trabalho. Hoje, as pessoas não querem trabalhar nos hospitais, não querem fazer bancos, tentam safar-se. São todos contra todos. Bastaram uns anos para destruir a solidariedade no hospital. O que aconteceu é aterrador.

O que é importante perceber é que a destruição dos elos sociais no trabalho pelos gestores nos fragiliza a todos perante a doença mental. E é por isso que as pessoas se suicidam. Não quer dizer que o sofrimento seja maior do que no passado; são as nossas defesas que deixaram de funcionar.

Portanto, as ferramentas de gestão são na realidade ferramentas de repressão, de dominação pelo medo.
Sim, o termo exacto é dominação; são técnicas de dominação.

Então, é preciso acabar com essas práticas?
Eu não diria que é preciso acabar com tudo. Acho que não devemos renunciar à avaliação, incluindo a individual. Mas é preciso renunciar a certas técnicas. Em particular, tudo o que é quantitativo e objectivo é falso e é preciso acabar com isso. Mas há avaliações que não são quantitativas e objectivas – a avaliação dos pares, da colectividade, a avaliação da beleza, da elegância de um trabalho, do facto de ser conforme às regras profissionais. Trata-se de avaliações assentes na qualidade e no desempenho do ofício. Mesmo a entrevista de avaliação pode ser interessante e as pessoas não são contra.

Mas sobretudo, a avaliação não deve ser apenas individual. É extremamente importante começar a concentrar os esforços na avaliação do trabalho colectivo e nomeadamente da cooperação, do contributo de cada um. Mas como não sabemos analisar a cooperação, analisa-se somente o desempenho individual.

O resultado é desastroso. Não é verdade que a qualidade da produção melhorou. A General Motors foi obrigada a alertar o mundo da má qualidade dos seus pneus; a Toyota teve de trocar um milhão de veículos por veículos novos ou reembolsar os clientes porque descobriu um defeito de fabrico. É essa a qualidade total japonesa?

Hoje, nos hospitais em França, a qualidade do trabalho não aumentou – diminui. O desempenho supostamente melhorou, mas isso não é verdade, porque não se toma em conta o que está a acontecer do lado do trabalho colectivo.

Temos de aprender a pensar o trabalho colectivo, de desenvolver métodos para o analisar, avaliar – para o cultivar. A riqueza do trabalho está aí, no trabalho colectivo como cooperação, como maneira de viver juntos. Se conseguirmos salvar isso no trabalho, ficamos com o melhor, aprendemos a respeitar os outros, a evitar a violência, aprendemos a falar, a defender o nosso ponto de vista e a ouvir o dos outros.

Não haverá por detrás desta nova organização do trabalho objectivos de controlo das pessoas, de redução da liberdade individual, que extravasam o âmbito empresarial?
É uma questão difícil. Acho que qualquer método de organização do trabalho é ao mesmo tempo um método de dominação. Não é possível dissociar as duas coisas. Há 40 anos que os sociólogos trabalham nisto. Todos os métodos de organização do trabalho visam uma divisão das tarefas, por razões técnicas, de racionalidade, de gestão. Mas não há nenhuma divisão técnica do trabalho que não venha acompanhada de um sistema de controlo, em virtude do qual as pessoas vão cumprir as ordens.

Há tecnologias da dominação. O sistema de Taylor, ou taylorismo, é essencialmente um método de dominação e não um método de trabalho. O método de Ford é um método de trabalho.

Contudo, não penso que a intenção do patronato (francês, em particular), nem dos homens de Estado seja instaurar o totalitarismo. Mas é indubitável que introduzem métodos de dominação, através da organização do trabalho que, de facto, destroem o mundo social.

Qual é a diferença entre taylorismo e fordismo?
Taylor inventou a divisão das tarefas entre as pessoas e a interposição, entre cada tarefa, de uma intervenção da direcção, através de um capataz. Há constantemente alguém a vigiar e a exigir obediência ao trabalhador. A palavra-chave é obediência. “Quando eu disser para parar de trabalhar e ir comer qualquer coisa, você vai obedecer. Se concordar, será pago mais 50 cêntimos pela sua obediência.” A única coisa que importa é a obediência. O objectivo é acabar com o ócio, os tempos mortos.

Só muito mais tarde é que Ford introduziu uma nova técnica, a linha de montagem, que é uma aplicação do taylorismo. Na realidade, não é o progresso tecnológico que determina a transformação das relações sociais, mas a transformação das relações de dominação que abre o caminho a novas tecnologias.

O toyotismo [ou Sistema Toyota de Produção] utiliza um outro método de dominação, o ohnismo [inventado por Taiichi Ohno (1912-1990)], diferente do taylorismo. É um método particular que extrai a inteligência das pessoas de uma forma muito mais subtil que o taylorismo, que apenas estipula que há pessoas que têm de obedecer e outras que mandam.

No ohnismo, trata-se de fazer com que pessoas beneficiem a empresa oferecendo a sua inteligência e os conhecimentos adquiridos através da experiência. Para o fazer, nos anos 1980, introduziu-se algo de totalmente novo: os chamados “círculos de qualidade”.

O sistema japonês foi realmente uma novidade em relação ao taylorismo, porque ensinou as pessoas a colaborar sem as obrigar a obedecer – dando-lhes prémios, pelo contrário. Quando uma sugestão de uma pessoa dá lucro, a empresa faz o cálculo do dinheiro que a empresa ganhou com a ideia e reverte para o trabalhador uma parte desse lucro. Trata-se de prémios substanciais.

Mas há uma batota: os círculos de qualidade podiam durar horas, todos os dias, reunindo as pessoas a seguir ao trabalho para alimentar a caixinha das ideias. Todos se envolviam porque, por um lado, uma ideia que permitisse melhorar a produção valia-lhes chorudos prémios, mas também porque quem participava neles tinha um emprego vitalício garantido na empresa.

O sistema foi exportado para a Europa, os EUA, etc. porque durante uns tempos, a qualidade melhorou de facto. Mas a dada altura, as pessoas no Japão trabalhavam tanto que começou a haver mortes por karōshi [literalmente “morte por excesso de trabalho”].

O que é o karōshi?
É uma morte súbita, geralmente por hemorragia cerebral (AVC), de pessoas novas que não apresentam qualquer factor de risco cardiovascular. Não são obesos, não sofrem de hipertensão, não têm níveis de colesterol elevados, não são diabéticos, não fumam, não são alcoólicos, não tem uma história familiar de AVC. Nada. A único factor que é possível detectar é o excesso de trabalho. Estas pessoas trabalham mais de 70 horas por semana, sem contar as horas passadas nos círculos de qualidade. Ou seja, são pessoas que estão literalmente sempre a trabalhar. Mal param de trabalhar, vão dormir. As descrições de colegas que foram fazer inquéritos no Japão são aterrorizadoras.

O mundo do trabalho no Japão é alucinante. Há raparigas que entram nas fábricas de electrónica, por exemplo, e que são utilizadas entre os 18 e os 21 anos – porque aos 21 anos, já não conseguem aguentar as cadências de trabalho.

As famílias confiam-nas às empresas por esses três anos, durante os quais elas se entregam de corpo e alma ao trabalho. E nalguns casos, a empresa compromete-se a casar a rapariga no fim dos três anos. É mesmo um sistema totalitário. E mais: essas jovens trabalham 12 a 14 horas por dia e depois vão para uns dormitórios onde há uma série de gavetões – cada um com cama e um colchão –, deitam-se na cama e fecha-se o gavetão. Dormem assim, empilhadas em gavetões. Três anos… em gavetões… é preciso ver para crer.

Mas uma coisa destas não é aplicável na Europa
Não, pelo menos em França nunca funcionaria. Ainda não chegámos lá, disso tenho a certeza.

Mas acha que poderia acontecer?
Sim, acho que poderíamos lá chegar. Tudo é possível. Mas ao contrário do que se diz, não há uma fatalidade, não é a mundialização que determina as coisas, não é a guerra económica. É perfeitamente possível, no contexto actual, trabalhar de outra maneira, e há empresas que o fazem, com uma verdadeira preocupação de preservar o “viver juntos”, para tentar encontrar alternativas à abordagem puramente de gestão. O que não impede que a tendência seja para a desestruturação um pouco por todo o lado. É difícil resistir-lhe.

Uma empresa que defendesse os princípios da liberdade, da igualdade e da fraternidade conseguiria sobreviver no actual contexto de mercado?
Hoje, estou em condições de responder pela afirmativa, porque tenho trabalhado com algumas empresas assim. Ao contrário do que se pensa, certas empresas e alguns patrões não participam do cinismo geral e pensam que a empresa não é só uma máquina de produzir e de ganhar dinheiro, mas também que há qualquer coisa de nobre na produção, que não pode ser posta de lado. Um exemplo fácil de perceber são os serviços públicos, cuja ética é permitir que os pobres sejam tão bem servidos como os ricos – que tenham aquecimento, telefone, electricidade. É possível, portanto, trabalhar no sentido da igualdade.

Há também muita gente que acha que produz coisas boas – os aviões, por exemplo, são coisas belas, são um sucesso tecnológico, podem progredir no sentido da protecção do ambiente. O lucro não é a única preocupação destas pessoas.

E, entre os empresários, há pessoas assim – não muitas, mas há. Pessoas muito instruídas que respeitam esse aspecto nobre. E, na sequência das histórias de suicídios, alguns desses empresários vieram ter comigo porque queriam repensar a avaliação do desempenho. Comecei a trabalhar com eles e está a dar resultados positivos.

O que fizeram?
Abandonaram a avaliação individual – aliás, esses patrões estavam totalmente fartos dela. Durante um encontro que tive com o presidente de uma das empresas, ele confessou-me, após um longo momento de reflexão, que o que mais odiava no seu trabalho era ter de fazer a avaliação dos seus subordinados e que essa era a altura mais infernal do ano. Surpreendente, não? E a razão que me deu foi que a avaliação individual não ajuda a resolver os problemas da empresa. Pelo contrário, agrava as coisas.

Neste caso, trata-se de uma pequena empresa privada que se preocupa com a qualidade da sua produção e não apenas por razões monetárias, mas por questões de bem-estar e convivialidade do consumidor final. O resultado é que pensar em termos de convivialidade faz melhorar a qualidade da produção e fará com que a empresa seja escolhida pelos clientes face a outras do mesmo ramo.

Para o conseguir, foi preciso que existisse cooperação dentro da empresa, sinergias entre as pessoas e que os pontos de vista contraditórios pudessem ser discutidos. E isso só é possível num ambiente de confiança mútua, de lealdade, onde ninguém tem medo de arriscar falar alto.

Se conseguirmos mostrar cientificamente, numa ou duas empresas com grande visibilidade, que este tipo de organização do trabalho funciona, teremos dado um grande passo em frente.

|Fonte: Ana Gerschenfeld, Público

Cyberbullying:A vida infernal das vítimas de humilhação pela Net


Fenómeno está a aumentar no País. As vítimas, crianças e adultos, não contam o drama que vivem com medo de represálias.

Ana viu a sua vida tornar-se num inferno depois de fotografias provocantes suas serem espalhadas pela Internet. Filipa vivia aterrorizada por o ex-namorado a ter difamado nas redes sociais. Cátia defendeu o aborto e vingaram-se dela, colocando um vídeo de sua casa na Net (ver histórias em baixo). Todas são vítimas de cyberbullying - intimidação e violência psicológica na Internet, fenómeno que está a aumentar em Portugal, alerta Tito Morais, responsável pelo site miúdos seguros na Net.

De acordo com este especialista, a subida de casos está a ser facilitada pela adesão dos portugueses às redes sociais e bloguess. Mas, por ser novo, o fenómeno não está quantificado. Por isso, uma equipa da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra, liderada pelo professor João Amado, está a realizar um inquérito e a criar um manual sobre cyberbullying para ajudar formandos, pais e professores (ver caixa).

Certo, diz Tito de Morais, é que grande parte das vítimas são adolescentes e crianças, que passam horas a fio ao computador. Problema que se agrava, muitas vezes não alertarem os pais para o problema com que estão a lidar. "As vítimas têm medo de admitir aos pais. Receiam perder privilégios na utilização do computador. Muitos pensam mesmo que a culpa é deles por não terem respeitado alguma regra", conta Tito Morais.

Para a psicóloga e professora universitária Sónia Seixas é importante "educar os pais de forma a aperceberem-se de sinais que mostrem que os filhos estejam a ser vítimas de cyberbullying".

Segundo um estudo feito em nove países europeus, pela consultora Meddiappro, mais de 90% dos jovens portugueses entre os 11 e os 19 anos, têm telemóvel e usa a Internet sem restrição por parte dos pais. Um situação que dizem os peritos é perigosa. A especialista sublinha mesmo que os pais "devem saber o que os filhos fazem" e deixa um conselho: "Coloquem o computador num local comum e não no quar- to da criança, onde é mais fácil fugir ao controlo parental."

A mesma opinião tem João Amado: "Os pais não podem ser tão indiferentes. Há que alertar as pessoas para o perigo."

E o perigo é real, sendo que o agressor tem a vida facilitada por se poder esconder no anonimato. Nos EUA e Reino Unido o fenómeno está a alastrar-se à velocidade das novas tecnologias e até há já registos de suicídios.

Mas o cyberbullying não é exclusivo de crianças. Nos adultos os termos são ciberassédio ou ciberperseguição. "É uma nova forma de violência, mas pessoas ficam renitentes em fazer queixa na polícia", realçou Tito Morais, explicando que a maioria das vítimas nem percebe bem do que é que está a ser vítima.

Por isso, o responsável do site miúdos seguros na Net lembra que é preciso apostar na prevenção. E uma das medidas que considera mais urgente é a de o tema ser discutido nos estabelecimentos de ensino: "O cyberbullying deve ser tratado nas escolas, co-mo por exemplo na disciplina de Formação Cívica." Além disso, defende ainda que o Governo se-ja mais exigente na regulamentação das leis na Internet, criando regras de comportamento que evitem que todos os dias milhares de pessoas sejam humilhadas e ameaçadas através de um computador.

|Fonte: Elisabete Silva, DN

Automutilação cresce entre os mais jovens

Criar proximidade e falar abertamente do assunto são estratégias para detectar sinais de perigo e prevenir suicídios e automutilações.

A depressão é a principal causa de suicídio em todas as idades, incluindo os jovens", afirma Daniel Sampaio, autor de extensa bibliografia sobre a matéria e investigador do Núcleo de Estudos do Suicídio do Hospital de Santa Maria, Lisboa. "Há um continuum de sofrimento, de desesperança. Não é por ter uma negativa ou perder a namorada que um jovem se mata. Os suicídios repentinos são excepcionais", sublinha.

Há uma história de tristeza intensa e prolongada, alterações no sono e no apetite, falta de esperança na vida e nos outros, culpa, desespero e, frequentemente, ideação suicida claramente verbalizada. "Entre os que se suicidaram, 70% avisaram que o iam fazer", alerta o psiquiatra, que enfatiza a necessidade de valorizar sempre essas mensagens. Valorizar não significa culpar ou repreender, mas, antes, "criar proximidade". Ou seja, gerar oportunidades para se falar do assunto, sem mitos ou tabus, e estar presente, o mais possível. Pedir ajuda especializada é também aconselhável quando os sintomas se avolumam.

Os sinais de depressão nem sempre são descodificados pelos pais, professores e amigos. São confundidos com a instabilidade emocional característica da adolescência. Daniel Sampaio explica que o comportamento normal distingue-se do patológico pela intensidade e persistência com que se apresenta. "Se um jovem tira uma negativa, não é significativo, mas se tirar quatro ou cinco pode ser. Se de vez em quando, gosta de estar sozinho no quarto é normal, mas se o isolamento social é persistente, pode ser problemático. Gritar numa discussão não é relevante, mas se o jovem grita todos os dias e recusa frequentemente o convívio familiar, pode ser motivo de alarme."

Num contexto de sofrimento e de desesperança quanto ao futuro, perdas, humilhações, rejeições ou fracassos podem ser a gota de água que transborda o copo do desespero e espoletar o suicídio.

Um estudo realizado em 1999, com 800 adolescentes de vários pontos do país, concluiu que um terço dos jovens apresentava ideação suicida. A passagem do pensamento ao acto depende, porém, de vários factores, sendo o suporte familiar e dos amigos um dos mais importantes, sublinha Maria Gouveia Pereira, autora de vários estudos sobre o suicídio na adolescência e professora do Instituto Superior de Psicologia Aplicada/Instituto Universitário.

Conspiração do silêncio

O problema é que apoiar pressupõe valorizar os sinais e ser capaz de falar sobre o assunto. "É mais fácil negar, desvalorizar ou silenciar. Calámos o que nos incomoda", considera a psicóloga. Uma acentuada descida no desempenho escolar é o sintoma mais valorizado pelos pais, mas há outros, igualmente preocupantes, como o isolamento social. "Um jovem que não sai à noite, não arranja problemas, não bebe e não fuma, não suscita preocupações aos pais, mas a falta de amigos, de convívio com pares, pode ser indiciador de que algo não está bem", enfatiza a psicóloga.

A conspiração do silêncio alimenta a ignorância. Duas investigações realizadas em Portugal demonstraram que adolescentes e os professores não sabem reconhecer os sintomas de perigo e, consequentemente, são inaptos para ajudar, sublinha Maria Gouveia Pereira.

Os números oficiais referem uma diminuição da taxa de suicídios em Portugal. Contudo, trata-se de um assunto incómodo. Até para as estatísticas. Em caso de dúvida, é preferível classificar a morte de um jovem como acidental ou devido a causas indeterminadas, mesmo que as circunstâncias - como a queda de um prédio alto ou na via férrea - sejam suspeitas. A realização sistemática de autópsias psicológicas ajudaria a clarificar muitas situações.

Automutilação para aliviar sofrimento

Os suicídios podem estar a diminuir, mas há indicadores de risco que estão a aumentar. É o que acontece com os para-suicídios: auto-agressões, como cortes e queimaduras, infligidas para aliviar sofrimento psicológico através da dor física, mais controlável e, por isso, mais tolerável. "Não há estudos rigorosos sobre os para-suicídios, mas calcula-se que por cada caso que chega às unidades de saúde, haja três que não são conhecidos", de acordo com Carlos Braz Saraiva, psiquiatra que há longos anos estuda a suicidologia e responsável pela criação da Consulta de Prevenção do Suicídio dos Hospitais da Universidade de Coimbra (HUC).

O único estudo epidemiológico, realizado em Coimbra em 1996, deu conta de uma realidade inquietante (600 casos por cem mil habitantes e por ano), principalmente entre as raparigas dos 15 aos 24 anos. No fim da década passada, uma actualização desses números apontava para um aumento de 25%. O empirismo clínico colabora essa tendência. "Todos os dias, dão entrada na Urgência dos HUC dois ou três casos de para-suicídio, de todas as faixas etárias", refere Braz Saraiva.

Música e suicídio

Outra investigação, realizada no âmbito de uma tese de doutoramento sobre música, morte e suicídio, apurou que 35% dos jovens inquiridos assume ter tido comportamentos de auto-mutilação. Abílio Oliveira, psicólogo social e docente do Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa, estudou 1300 jovens dos 15 aos 19 anos e concluiu que há uma associação entre o gosto por música dita pesada e comportamentos de risco e ideação suicida. Contudo, "não se pode falar de relação de causalidade", enfatiza o autor de Ilusão na idade das emoções, acrescentando que ninguém resolve matar-se por ouvir determinada música ou ler certo escritor.

"Os gostos musicais são um bom indicador dos sentimentos do adolescente, desde que enquadrados no modo como encara a vida e representa a morte, o suicídio e a si próprio" , sublinha Abílio Oliveira. E acrescenta: "Os adolescentes dizem que querem morrer, acabar com tudo, mas na realidade querem é desaparecer daquela vida. Ao tentar a morte, esperam sobreviver e renascer para um sentido para a vida. A morte não é o fim. É um fim".

|Fonte: JN

Sabedoria das multidões ajuda a pensar melhor

Há um antigo ditado popular que diz que duas cabeças pensam melhor do que uma. Esse ditado recebeu confirmação empírica na Psicologia Social dos anos 20, quando uma série de estudos mostrou que os grupos eram mais acurados do que os seus membros de forma individual. Em uma, das primeiras demonstrações do fenómeno, por exemplo, Hazel Knight, da Columbia University, pediu para que os seus alunos apresentassem uma estimativa da temperatura na sala de aula. Quando uma média das estimativas era calculada, a hipótese do grupo era mais próxima do correcto do que a estimativa de um membro isolado.

Os primeiros autores acharam o facto surpreendente, e atribuíram-no a alguma propriedade misteriosa do grupo. Finalmente, então, o resultado foi reconhecido como um produto da estatística: usar uma grande amostragem de estimativas imperfeitas tende a cancelar erros extremos, convergindo para o resultado correcto. Pesquisas subsequentes na área de planeamentos estratégicos demonstraram que os cálculos feitos por uma média são mais “poderosos” quando comparados aos mais sofisticados métodos de combinação estatística. A capacidade e a simplicidade do cálculo de média foram resumidas no best seller de James Surowiecki, “The Wisdom of Crowds” (A Sabedoria das Mulditões, em português), de 2004.

Em um fascinante artigo da Psychological Science, Stefan Herzog e Ralph Hertwig fizeram cair por terra o velho ditado. Segundo eles, uma cabeça pode ser tão boa quanto duas. Herzog and Hertwig pediram aos participantes de sua pesquisa para que estimassem valores quantitativos que não sabiam ao certo – sobretudo datas históricas. Os autores, então, solicitaram que os participantes pensassem numa segunda estimativa. Poderia essa “multidão na mente” ajudar na melhoria das hipóteses? A resposta é sim, e a literatura da sabedoria das multidões ajuda-nos a entender o porquê.

Multidões, obviamente, nem sempre são sábias. No entanto, é mais provável que elas ajam de forma sábia se dois princípios forem seguidos. O primeiro deles é que os grupos devam ser compostos por pessoas com conhecimentos relevantes sobre o assunto. O segundo princípio é que o grupo deva oferecer diversas perspectivas e diferentes conhecimentos relacionados com o tema. Dar valor à diversidade tem-se tornado um facto inquestionável, mas é interessante considerar exactamente como ela afecta a tomada de decisões. As pessoas cometem erros, e isso é inevitável. A questão, então, passa a ser se as pessoas cometem erros similares (nesse caso, a substituição dos indivíduos traria poucos benefícios ao grupo) ou se as pessoas cometem erros distintos (nesse caso, os seus erros seriam anulados).

As diferenças nas perspectivas são criadas tanto pelos membros do grupo (quando as pessoas têm diferentes experiências, formação e modelos de julgamento) quanto pelos processos (quando as ideias são formadas e expressas de forma independente das ideias dos demais membros). É interessante observar que os benefícios da diversidade são tão fortes que, apesar de participantes com habilidades extremamente diferentes serem escolhidos para um mesmo grupo, ainda assim são constatados ganhos.

Herzog e Hertwig usaram os princípios da perspectiva da “sabedoria das multidões” para possibilitar que uma cabeça se tornasse quase tão produtiva quanto duas. Após os participantes pensarem nas suas primeiras hipóteses sobre as datas de eventos históricos, os autores solicitaram, então, uma segunda estimativa, aplicando um dos seguintes métodos. No primeiro, os participantes apenas apresentaram uma segunda estimativa, o que contribuiu muito pouco para o conhecimento e a diversidade.

Já no segundo, foram fornecidas aos participantes instruções detalhadas sobre como deveriam apresentar a estimativa subsequente: “Primeiro: façam de conta que sua primeira estimativa está incorrecta. Segundo: pense sobre algumas razões pelas quais o erro pode ter ocorrido - quais suposições e considerações podem ter sido erradas? Terceiro: o que as novas considerações sugerem? Quarto: baseado nessa nova perspectiva faça uma segunda estimativa”. Quando os participantes usaram o método mais “evoluído”, a média foi significativamente mais acurada do que a apresentada na primeira. A “multidão envoluída” atingiu aproximadamente metade da exactidão a que se teria chegado se a data tivesse sido estimada por uma segunda pessoa.

Herzog e Hertwig nomearam o processo de maior envolvimento de “bootstrapping dialéctico”. Você pode superar-se utilizando apenas o seu bootstrap baseado no provérbio de que duas cabeças pensam melhor do que uma - supondo que você esteja errado, estipulando uma segunda estimativa apoiada na busca por evidências, e então calculando a média das duas estimativas. É interessante notar que, de acordo com os estudos de Herzog e Hertwig, o bootstrapping não levou a segundas estimativas mais corretas que as primeiras. O benefício do bootstrapping dialéctico somente foi percebido quando a primeira e a segunda estimativas eram analisadas juntas. Se comparado ao simples estabelecimento de um segundo julgamento, o bootstrapping dialéctico criou diversidade – ele leva a estimativas que, provavelmente, oferecem erros compensatórios.

Embora tenhamos a habilidade de gerar múltiplas perspectivas, normalmente apegamo-nos a apenas uma das formas de se abordar o problema – com as suas limitadas possibilidades de acerto e erro. Temos a tendência de parar na primeira etapa. O bootstrapping dialéctico possibilita a busca de outras perspectivas que já existem na nossa mente. Um princípio chave do estudo de Herzog e Hertwig é que cada um de nós carrega a nossa própria “multidão”, o nosso próprio grupo de conselheiros. No entanto, usufruímos da sua sabedoria apenas se conduzirmos uma “reunião” produtiva, que assegure a ocorrência da diversidade na mesa e que não se limite à verbalização de diferentes perspectivas, mas as incorpore, efectivamente, na decisão final. Herzog e Hertwig criaram um processo para a realização de uma boa reunião de conselheiros – na privacidade de sua própria mente.
|Fonte: Gazeta de Alagoas

Crianças ricas. São 5,7 centímetros mais altas


Investigadores avaliaram a evolução da estatura dos alunos do Colégio Militar e da Casa Pia no último século. Resultados mostram desigualdade

Sim, as classes sociais podem medir-se aos palmos. A opinião é dos antropólogos que decidiram avaliar as diferenças na estatura dos alunos do Colégio Militar e da Casa Pia, duas instituições de Lisboa. As diferenças encontradas permitem tirar lições socioeconómicas, garantem os autores do trabalho nascido na Universidade de Coimbra, e que agora é publicado na revista "Economics and Human Biology". Os resultados mostram que as diferenças físicas entre os rapazes das duas instituições - a primeira rotulada como escola de famílias mais favorecidas e a segunda de crianças pobres - têm vindo a atenuar-se, embora continuem a ser significativas. Ao longo do último século os alunos do Colégio Militar somaram em média mais 6,4 centímetros de altura e mais 4,8 quilos do que os colegas da Casa Pia.

O trabalho analisou mais de 4000 medidas recolhidas pelas duas instituições desde o início do século passado. A matéria-prima permitiu uma avaliação da evolução das estaturas por idades, entre os dez e 16 anos. Demonstrou-se que, na altura média, a diferença entre os dois grupos caiu de 7,0 centímetros, em 1910, para 5,7 centímetros em 2000 - uma melhoria significativa. No peso houve apenas uma ligeira atenuação, de 4,9 quilos de diferença para 4,6 quilos. No índice de massa corporal (IMC), os alunos do Colégio Militar têm valores médios apenas 1,9% superiores. Conclui-se ainda que, no último século, as alturas dos rapazes dos dois estabelecimentos aumentaram em média 13,6 centímetros e o peso 13,5 quilos - valores que espelham a melhoria das condições de vida no país, sobretudo a partir da década de 1960, explicam os autores.

Ainda assim, os valores da desigualdade surpreenderam: "Sabemos que as crianças socialmente desfavorecidas tendem a ser mais baixas e menos robustas - o que reflecte condições de vida empobrecidas - mas conseguimos perceber qual era a diferença entre estes dois grupos no início do século, e qual é a diferença hoje", diz Hugo Cardoso. O investigador em antropologia biológica, e um dos autores do trabalho, tem utilizado a avaliação antropométrica como um indicador para o desenvolvimento da sociedade. "Os historiadores de economia analisam a evolução socioeconómica com indicadores relacionados com a moeda ou com o PIB, que na prática acabam por ser muito pouco específicos sobre a forma como sociedade funciona. Os dados sobre a estatura dão-nos uma imagem bastante real do impacto das disparidades", defende.

A base tem sido o arquivo do Colégio Militar - por ter sido fundado em 1803 e ter dados sistematizados sobre a estatura dos alunos. Desta vez, uma colaboração com uma professora de Educação Física da Casa Pia de Lisboa permitiu uma análise comparativa entre a população de um colégio associado à elite e a de uma instituição fundada depois do terramoto de 1755 para apoiar jovens desfavorecidos, com princípios de protecção que se foram mantendo até hoje. O estudo confirmou uma "lacuna alarmante entre a saúde dos ricos e a dos pobres, que as recentes reformas sociais e económicas não conseguiram reduzir de forma significativa", escrevem os autores no final do artigo. Os indicadores são variados: descobriu-se, por exemplo, que entre 1910 e 2000, a altura média de uma criança com 13 anos no Colégio Militar aumentou 15,4%, de 1,46 metros para 1,61 metros. Na Casa Pia de Lisboa, nesta mesma idade, o aumento foi de 11,8%, de 1,39 metros para 1,55 metros. A taxa de crescimento virtual por década foi calculada em 1,4 cm/1,5 cm e 1,5 kg, embora as medidas dos alunos da Casa Pia sejam sempre menos robustas. "Houve uma diminuição da diferença entre estaturas, mas é tão pequena que se torna curioso perceber como é que durante 100 anos não houve oportunidade para as desigualdades sociais diminuírem", afirma o investigador.

Duplo fardo Para Miguel Rego, nutricionista e colaborador da Direcção-Geral da Saúde, perante estes dados, é importante não esquecer a questão do "duplo fardo" das populações socialmente mais desfavorecidas. "Temos a criança com menos peso, com uma nutrição pior, mas cada vez mais surge o problema da obesidade, com vários estudos que apontam para uma prevalência mais elevada nestes grupos", sublinha. "Ao ver esta clara diferença entre grupos, que ainda que tenha vindo a diminuir mantém-se, devemos pensar claramente onde actuar primeiro", sugere. O especialista acredita que a estratégia para combater esta disparidade, resultado da nutrição e dos cuidados de saúde, passará pela reorganização em curso dos cuidados primários. "Temos de abandonar a visão hospitalocêntrica, e fazer valer estes serviços não só como um sítio onde se procura saúde quando se está doente, mas como um parceiro activo na comunidade, nas escolas e no trabalho para promover hábitos alimentares e uma população com mais acesso à informação e capacidade de a interpretar."
|Fonte: Jornal "I"

Doente em coma consegue contactar com os médicos

Um homem que estava em estado vegetativo desde há cinco anos conseguiu comunicar e responder “sim” e “não” usando unicamente a sua mente, revela um estudo no qual participaram investigadores da Universidade de Lieja, na Bélgica, e Cambridge, no Reino Unido. O resultado foi publicado no New England Journal of Medicine.
A equipa de investigadores desenvolveu um novo método que permite a pacientes incapazes de se mexerem ou falar, comunicarem com o mundo exterior por meio de novas tecnologias de scanner cerebral.
Em 2003, o homem de 29 anos, cuja identidade não foi revelada, sobreviveu a um grave acidente de trânsito mas ficou sem se poder mexer ou falar, num estado considerado vegetativo. A sua actividade cerebral foi examinada graças à técnica de Imagem por Ressonância Magnética Funcional (IRMF), enquanto respondia a questões simples como: “O nome do seu pai é Thomas?”. Os investigadores conseguiram perceber que eram activadas as mesmas áreas do cérebro que no indivíduo saudável.
"Ficamos chocados quando vimos os resultados do paciente. Ele era capaz de responder correctamente às nossas perguntas, que eram logo descodificadas pelo sistema IRMF", explicou Adrian Owen, professor de neurologia da Universidade de Cambridge.
Entretanto, a experiência foi realizada em mais 23 pacientes em coma, dos quais quatro deram sinais de consciência. “Pessoas aparentemente em coma poderiam responder sobre a sua dor”, salientou a neurologista belga Audrey Vanhaudenhuyse, mas alerta para o facto de nem todos os pacientes em estado vegetativo terem actividade cerebral.
Recorde-se que há dois meses foi noticiada a história de Rom Houben, um belga vítima de um acidente de carro que os médicos acreditavam estar em estado de coma durante 23 anos, mas que mais tarde se veio a provar que durante todos esses anos tinha plena consciência do que acontecia ao seu redor.
Fonte: Jornal "I"

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Doente em estado vegetativo comunica

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

O limite do ser humano é ter 150 amigos?


Um estudo da Universidade de Oxford divulgado recentemente e em destaque no The Times nesta segunda-feira levantou uma possível importância que o número de Dunbar tem na relação social entre humanos. Segundo a pesquisa, o cérebro humano é capaz de administrar em redes sociais, no máximo, 150 amigos.

Robin Dunbar, antropólogo da instituição e autor da pesquisa, conseguiu pela primeira vez comprovar no mundo on-line a teoria que defendia na década de 90. Na época, o cientista concluiu a partir de observações de vários grupos que a capacidade de manter círculos sociais não passava do número 150, independente do grau de sociabilidade de cada pessoa.

Na web, a teoria já foi questionada. Em Fevereiro, o sociólogo Cameron Marlow descobriu que um internauta comum consegue estabelecer uma relação estável com o próximo com no máximo 120 contactos em perfis no Facebook. Russerd Bernard, da Universidade da Flórida, concluiu que, nos Estados Unidos, os laços de amizade de uma pessoa podem chegar a 290.

Essas limitações existem devido a capacidade do neocórtex cerebral, que não se desenvolveu durante a evolução do homem. Em pouco tempo, o registo foi tão valorizado na Internet que já existiram redes sociais que o adoptavam para definir critérios de ingresso nas plataformas participativas.

A rede social aSmallWorld, considerada como “Orkut dos ricos”, usou este discurso para defender seus princípios de uso e, claro, alcançar valorização e alarde em torno de seu serviço.

A construção do mito de que as novas tecnologias poderiam superar tal limitação não é o único facto que mais chama a atenção. O estudo corrobora a premissa de que o internauta, hoje, reforça mais laços construídos de forma offline (cotidiano) do que propriamente criar novas amizades virtuais.

|Fonte: Revista Veja

Doente em estado vegetativo comunica

Há uma tecnologia que permite ver o cérebro a pensar, ou, mais precisamente, os fluxos de sangue para determinadas zonas cerebrais consoante estas são activadas para dar resposta a determinadas tarefas, que podem ser tão simples como responder "sim" ou "não" a uma pergunta.

O que aconteceria se fosse usada para espreitar para o cérebro de pessoas que estão há anos num estado vegetativo, já não em coma? Em alguns casos, descobriram médicos na Universidade de Liège, na Bélgica, foi possível ver o seu cérebro acender-se, comunicando com o exterior as respostas de "sim" e "não" a perguntas simples que lhes eram feitas.

Um homem que em 2003, aos 29 anos, teve um grave acidente rodoviário ficou em coma. Quando acordou, ficou apenas num estado vegetativo - não tem capacidade de linguagem nem de interacção com os outros, apenas algumas reacções reflexas. Há cinco anos que estava assim, até que os médicos do Coma Science Group da Universidade de Liège e da Unidade de Cognição e Ciências do Cérebro da Universidade de Cambridge (Reino Unido) o submeteram a um exame de ressonância magnética funcional - a tal tecnologia que permite ver o cérebro a pensar.

Este paciente foi um dos quatro entre os 23 em estado vegetativo testados que revelaram sinais de consciência, relatam agora os cientistas na revista New England Journal of Medicine. "Ele conseguia responder correctamente às perguntas, simplesmente modulando os seus pensamentos, que eram descodificados pela ressonância magnética funcional", diz Adrian Owen, de Cambridge, citado num comunicado da universidade belga.

Esta descoberta pode ter importantes implicações clínicas: "Pacientes que não podem mexer-se, nem falar para dizer o que sentem, poderão ser interrogados sobre se sentem dor, para permitir adaptar o tratamento com analgésicos", exemplifica Audrey Vanhaudenhuyse, neuropsicóloga da equipa de Liège.

Mas isto não quer dizer que todos os pacientes em estado vegetativo estejam conscientes - nesta amostra de 23, apenas quatro deram sinais de consciência. "Ainda é apenas um começo, mas esta técnica tem o potencial de melhorar a qualidade de vida dos pacientes", comentou Steve Laureys, também da equipa de Liège.
|Fonte: Público
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Doente em coma consegue contactar com os médicos

Investigadores britânicos estabelecem relação entre depressão e vício da Internet

Psicólogos britânicos conseguiram traçar uma relação entre o uso excessivo de Internet e a depressão. De acordo com investigadores da Universidade de Leeds, as pessoas que estão sempre ligadas à Net são as que apresentam mais sintomas de depressão.

Num artigo publicado no Jornal de Psicopatologia, os investigadores concluíram que um grupo reduzido de pessoas que participaram no estudo e foram classificadas como “viciadas em Internet” estavam mais sujeitas a depressões do que as pessoas não-viciadas.

Para chegar aos resultados, os investigadores conduziram um inquérito junto de 1319 jovens e adultos, que responderam a perguntas acerca do tempo que passavam online e o que é que faziam quando estavam ligados. Paralelamente, fizeram aos inquiridos uma série de perguntas-padrão para aferirem a gravidade dos seus problemas de depressão, através do uso do Beck Depression Inventory.

O relatório, levado a cabo pelo Instituto de Ciências Psicológicas da universidade, concluiu que 18 por cento das pessoas que completaram o questionário - 1,4 por cento do total - eram viciadas em Internet.

“O nosso estudo indica que o uso excessivo de Internet está associado à depressão, mas aquilo que nós não sabemos é o que vem primeiro - as pessoas deprimidas procuram mais a Internet ou é a Internet que está a deprimir as pessoas?”, referiu ao “The Guardian” a responsável pelo estudo, Catriona Morrison.

“Aquilo que fica claro é que, para um reduzido número de pessoas, o uso excessivo da Internet pode ser um sinal de alarme para tendências depressivas”, acrescentou.

A idade dos inquiridos variou entre os 16 e os 51 anos, situando-se a idade média dos entrevistados nos 21.24 anos. A média de idades do grupo identificado como “viciados em Internet” é de 18.3 anos.

Comparando os sinais de depressão registados dentro deste grupo com um grupo semelhante, composto por pessoas com uma idade média igualmente situada nos 18.3 anos, os investigadores concluíram que o grupo de “viciados em Internet” tem uma maior percentagem de pessoas com depressões moderadas e graves.

Os mesmos investigadores concluíram também que os “viciados” gastam, proporcionalmente, mais tempo a navegar por sites com conteúdos sobre sexo e jogo e por redes sociais.

“O estudo reforça a especulação pública que postula que ficar muito agarrado a sites que substituem as funções sociais normais pode significar transtornos psicológicos como a depressão e o vício”, disse Morrison.

“Precisamos agora de clarificar os efeitos do uso excessivo de Internet na saúde mental”, concluiu a investigadora.

Este artigo de seis páginas agora publicado é o primeiro grande estudo ocidental a considerar a relação entre o vício da Internet e a depressão. Muitos dos ensaios anteriores foram levados a cabo na Ásia, refere o “The Guardian”.

|Fonte: Público

Freud e a Psicanálise

Freud e a Psicanálise de Paulo Gomes